O caldo verde é uma sopa de couve galega, provavelmente a mais famosa de Portugal. De norte a sul do país, não há quem lhe resista...
Teve a sua origem no Minho, mas foi adoptado por todas as províncias portuguesas. Escritores e poetas como Camilo Castelo Branco, Eça de Queiroz, Júlio Dinis ou Ramalho Ortigão são apenas alguns dos escritores que o referenciam nas suas obras. António Correia de Oliveira, por exemplo, define o seu consumo como “núpcias de sustento e de sabor”. Já o poeta Reinaldo Ferreira descreve este típico caldo através de um poema que Amália Rodrigues cantou e imortalizou (Uma Casa Portuguesa), tornando-se numa espécie de hino nacional “basta pouco, poucochinho pr'a alegrar uma existência singela...é só amor, pão e vinho e um caldo verde, verdinho, a fumegar na tigela...”. Outro grande poeta, Fernando Pessoa, foi devoto consumidor desta simbiose de caldo de batata e couve-galega, cegada bem fina, com um subtil aroma a cebola e alho, para ajudar à substância. Com os seus olhos de fino azeite despertos à superfície e a sua tora de chouriço caseiro, afirmou-se como perzigo (conduto de carne ou peixe), tudo numa tigela fumegante com uma fatia de broa a fazer-lhe companhia. Saboroso caldo que foi em tempos de menor abundância prato principal para os menos abastados. Sempre ali, junto ao fogo da lareira, naquela panela de ferro, pronto para a partilha.
Actualmente, embora em desuso - pelo menos nos cardápios dos restaurantes da nossa praça, salvo raras excepções – continua a ser uma iguaria obrigatória de apreciar. Que seria de uma boa sardinhada, em noite de São João, se não houvesse o Caldo Verde para a sossega?
Não devemos esquecer a essência da cozinha regional e interpretá-la com verdade. No Minho existe uma cozinha cativante. Os seus aromas transportam-nos numa viagem à memória dos sabores e cheiros da nossa infância, fiéis a um paladar gravado no nosso subconsciente. É, por isso, importante a sua reabilitação e divulgação. São esses sabores e esses aromas o nosso património, a nossa cultura, e poressa razão somos responsáveis por deixar esse legado e hábitos às gerações vindouras.
Há que saber adaptar-nos às novas circunstâncias, mas sem perder as características de base. Cozinhar é uma arte e, como qualquer outra, não pode ficar parada no tempo. Tem de evoluir com gente capaz, que respeite a qualidade, confeccione com mestria, motivação e entusiasmo, porque cozinhar também é lúdico e cultural. Os comensais vão agradecer e assim permaneceremos na sua memória como bons anfitriões. Porque comer bem induz ao sentido dos sabores, à tertúlia e ao gosto pelo convívio.
Tudo isto faz mais sentido porque o Caldo verde também é de Valença, e o mais interessante é que existe uma receita publicada pelo menos em dois livros, do “Caldo Verde de Valença”. O primeiro, da autoria de Maria Odette Cortes Valente, grande historiadora na busca do receituário da cozinha tradicional Portuguesa. O segundo, de Manuel Paquete, que a transcreve no seu livro sobre “O azeite na cultura e no património alimentar.” Razões suficientes para que lhe seja dada a importância que tem de ter no contexto gastronómico Valenciano.
2 litros de água; 1dl de azeite; 750 g de batatas; 3 Dentes de alho; 1 Couve-galega tenra; 1 Chouriço; Sal q.b.
Deita-se a água numa panela com o azeite, as batatas descascadas e cortadas ao meio, a cebola e os dentes de alho. Tempera-se com Sal e deixa-se cozer. Logo que esteja cozido, tira-se do caldo e passa-se pela trituradora, voltando ao lume para apurar. Cortam-se as couves omais fino possível, lavam-se e deitam-se na panela quinze minutos antes de a sopa ir para a mesa, deixando-as ferver com a panela destapada. Serve-se o caldo verde em tigelas de barro, com uma rodela de chouriço no fundo e um bocadinho de broa.
por João Guterres, in Maria João de Almeida