O último relatório provisório do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e Florestas) dá conta da área florestal ardida até 15 de setembro - imagens de satélite do Sistema Europeu de Informação de Incêndios Florestais -, confirma que o norte do país foi a zona mais atingida e, tristemente, destaca a área flagelada no Parque Nacional da Peneda- -Gerês. Faz doer atravessar algumas estradas do habitual Minho verde, agora enegrecido aos pedaços, e onde o fogo não chegou já aparecem breves pinceladas outonais, tons fulvos e pastel intrometidos nos verdes que se misturam e nos fazem companhia na viagem.
Em pleno Alto Minho, o rio que lhe deu o nome, o Minho, corre por entre terras de Portugal e de Espanha sem fazer distinção ou tomar partido, alheado dos tempos em que o quiseram barreira. Do protocolo entre os dois Estados, os locais não querem saber, nem muito nem pouco. Eles que se entendam lá nas burocracias institucionais que as gentes se entendem no que lhes compete. A eurocidade Valença-Tui vive o ramerrame quotidiano em perfeita harmonia, ora do lado de cá, ora no lado de lá: os espanhóis vêm às compras e fazem turismo, os portugueses vão atestar os depósitos de gasolina. Num ponto de cruz bordado a boa vizinhança e intimidade linguística. Em Valença parece que se ouve falar mais espanhol que português. Dentro da Fortaleza, preciosa fortificação abaluartada que remonta à época medieval - pese embora a atual configuração da Praça-Forte, concluída por volta de 1700, se deva, por ironia, à necessidade de reforçar a defesa amuralhada por alturas da Guerra da Restauração -, as ruas fervilham de gente que se passeia, as lojas, porta sim porta sim, ostentam verdadeiros mostruários nas paredes exteriores e muitos dos letreiros das promoções estão em língua castelhana. É um autêntico centro comercial a céu aberto.
Situada no alto de uma colina, aconchegada nos muros da fortaleza, Valença do Minho exibe o donaire de moçoila minhota, bem trajada e ourada, a tal vaidade que por aqui se diz “chieira”. Altiva, espreita Tui, cidade medieval galega a que se liga, de mão dada, na Ponte Metálica sobre o rio Minho. Atravessada a ponte, é curto e bom o caminho para o centro histórico de Tui, cidade vetusta de porte heráldico. Na parte alta pontifica a imponente Catedral de Santa Maria, onde o românico e o gótico se conjugam belamente: se a iconografia dos capiteis românicos é magnífica, a portada principal e o seu requintado pórtico podem dizer-se o expoente do esplendor gótico da austera catedral.
Passar da buliçosa eurocidade para a ancilosada Comissão Europeia é como cair num poço sem fundo: continuam a inundar-nos com ameaças cujo fim não se adivinha. Do chamado “diálogo estruturado” com o Parlamento Europeu resultou mais do mesmo: exige-se que Portugal não se afaste do imposto trilho da austeridade. Já foi por demais comprovado que esse remédio leva à morte lenta: a economia definha, o serviço da dívida asfixia e o país não se consegue livrar da morrinha. Querem-nos mirradinhos. Ah, sorte macaca!
in Jornal I
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