O que resta da igreja do antigo Mosteiro de Ganfei é um dos mais elucidativos testemunhos da relação que a arte românica nacional do rio Minho estabeleceu com a vizinha e galega margem direita deste rio. Praticamente todos os autores que se debruçaram sobre este conjunto coincidiram na dependência estilística em relação à Sé de Tui (no campo escultórico) ou à igreja de São Bartolomeu de Rebordans (sobre a configuração dos pilares do corpo do templo (ALMEIDA, 2001, p.87)). A importância de Ganfei não é apenas artística, mas também geográfica, na medida em que se localizava na principal via Norte-Sul, entre Braga e Santiago de Compostela (ROSAS, 1991, p.320).
Este conjunto de factores, a que há que juntar o prestígio adquirido na época medieval - que levou o mosteiro a ser um dos mais poderosos de toda a região -, estará na origem do ambicioso programa arquitectónico da sua igreja, uma das poucas em todo o país românico a possuir um corpo de três naves e uma cabeceira tripartida, cuja capela-mor e absidíolos possuem dois tramos (IDEM, p.320). Na realidade, a organização espacial do templo insere-se na tipologia designada por "beneditina" (REAL, 1982), característica dos principais mosteiros nacionais do século XII ligados a esta Ordem. Lúcia Rosas, perante o maior alongamento que o habitual das naves e a maior dilatação do espaço entre pilares, colocou a hipótese de o resultado do corpo pertencer a uma reforma do século XIV, por iniciativa do abade Vicente Fernandez, e mais ou menos contemporânea de uma célebre estadia do conde de Barcelos, D. Pedro, no mosteiro (a quem a tradição atribui uma renovação do conjunto) (ROSAS, 1991, pp.323 e 326). A verdade, porém, é que não temos indicadores seguros desta campanha trecentista, nem tão pouco vestígios materiais. Por outro lado, a igreja de Ganfei diferencia-se das suas congéneres "beneditinas" (de Travanca ou de Paço de Sousa) por uma menor complexidade dos suportes das naves, facto que confere uma certa elegância à estrutura e a coloca numa linha evolutiva deste mesmo modelo (REAL, 1982, p.120).
A cronologia das obras parece confirmar uma fase relativamente tardia de evolução do esquema planimétrico e espacial "beneditino", como Manuel Real propôs. Ferreira de Almeida começou por lhe atribuir uma datação em torno dos meados da centúria (ALMEIDA, 1986, p.52), mas as análises mais recentes apontam para que a obra tenha sido realizada já nos finais do século (ALMEIDA, 2001, p.87), ou mesmo nos inícios de Duzentos.
Outra das marcas fundamentais deste templo é a sua escultura aplicada. Como monumento intimamente ligado à Galiza, os seus capitéis são o eco formal do estaleiro da Sé de Tui (ROSAS, 1987, vol.I, p.49), obra tutelar de todo o Românico da bacia do Minho ao longo da segunda metade do século XII. Eles caracterizam-se por uma escultura volumosa, ainda que não muito saliente do cesto, divergindo ligeiramente da exuberância que caracteriza os capitéis de Friestas e de Longosvales (ROSAS, 1987, vol.I, p.37). Apesar de não se vislumbrar qualquer programa iconográfico coerente, encontramos temas comuns em outras áreas românicas nacionais, como Aves bebendo da mesma taça ou um Homem sentado em atitude meditativa, composição que Manuel Monteiro identificou em outras igrejas galegas e que associou ao Caminho de Santiago (MONTEIRO, 1945, republ. 1980, p.321).
O mosteiro de Ganfei foi substancialmente adulterado na época moderna. Entre 1632 e 1761, ao longo de mais um século, construíram-se o claustro, o grosso do edifício conventual, a nova fachada principal (datada de 1693) e a ampla capela-mor, rectangular e barroca, que alterou, por completo, a espacialidade e iluminação originais do templo. Em 1760, no termo desta empreitada, transferiram-se solenemente as relíquias de São Ganfei para a nova capela-mor, cerimónia que simbolizou o fim das obras e a renovada imagem do mosteiro.
Está classificado como IIP - Imóvel de Interesse Público
in Património Cultural
Sem comentários:
Enviar um comentário